Alta nos preços do gás natural – matéria-prima importante para produzir o insumo – afetou o fornecimento do item em todo o planeta.
As preocupações com a oferta de fertilizantes em todo o planeta se intensificaram no início de novembro. No último dia 3, o Primeiro-ministro da Rússia, Mikhail Mishustin, confirmou que o país irá limitar suas exportações do insumo. A medida vale por seis meses e entra em vigor em dezembro. A notícia intensificou ainda mais as preocupações com a oferta de insumos agropecuários e deixa ainda mais explícita a dependência do Brasil na importação desses produtos.
Jeferson Souza, analista de fertilizantes da Agrinvest Commodities, produziu um levantamento que mostra que, de janeiro a setembro de 2021, as compras brasileiras no mercado russo apresentaram um aumento considerável, especialmente entre os itens que entraram nas limitações impostas pelo governo local. Nos primeiros nove meses desse ano, as importações brasileiras de MAP produzido na Rússia aumentaram 30%; as de ureia 20%, 29% de MOP e 98% de nitrato de amônio.
Os EUA também deverão sofrer com as medidas: o país importa 20% de sua ureia e 40% de seu nitrato de amônio somente da Rússia.
Todos estes produtos estão na lista do decreto que remove os procedimentos alfandegários simplificados para os fertilizantes com os seguintes códigos:
• ureia (3102101000, 3102109000);
• nitrato de amônia (3102301000, 3102309000);
• UAN (3102800000);
• NPKs (3105201000, 3105209000);
• DAP (3105300000);
• MAP (3105400000);
• NPs (3105510000, 3105590000).
O cloreto de potássio – KCl – ficou fora da lista e é um ponto importante para o mercado brasileiro. Boa parte do insumo utilizado no Brasil vem da Rússia. Embora o país não tenha colocado o fertilizante na lista de restrições, o quadro segue complicado. Os outros dois maiores exportadores mundiais – Canadá e Bielorrússia – passam por problemas no fornecimento deste produto e mantêm o quadro de oferta e demanda fragilizado.
Nitrogenados x Safra 2022/23
A preocupação com a falta de nitrogenados é forte e grave. Eduardo Vanin, analista de mercado da Agrinvest Commodities, afirma que o fornecimento de fertilizantes é um ponto determinante para a definição das próximas safras na temporada 2022/23, em especial para os produtores do hemisfério norte. Eles serão os primeiros a encarar o atual momento e os altos custos de produção – que poderão ser os mais elevados da história.
“O americano e o europeu, em fevereiro, terão que decidir o que irão plantar, tendo comprado quase nada antecipadamente. E este é o fator-chave para a definição do tamanho da área do milho e da soja. Se o plantio fosse hoje, com os atuais custos de produção, valeria mais a pena o produtor americano plantar soja e reduzir a quantidade de KCl, por exemplo, porque se plantar milho sem ureia, a produtividade será menor. E ele precisa de uma produtividade muito grande para remunerar os seus custos. Seria mais provável plantar mais trigo de primavera – que está num baita preço – e soja, e reduzir a área de milho. Esse é o grande ponto para o ano que vem”, detalha Vanin.
Entretanto, os nitrogenados são outro grande problema: parte das altas expressivas são reflexo de uma falta preocupante do produto no mercado global. Uma reportagem da agência internacional de notícias Bloomberg explicou que o insumo disponível hoje será insuficiente para atender a demanda dos produtores na próxima safra.
A falha no fornecimento do insumo pode ser explicada pelos atuais preços do gás natural na Europa – matéria-prima importante para a criação dos nitrogenados. A escalada dos preços do gás elevou o custo de produção de fertilizantes; por isso, algumas indústrias produtoras do insumo no continente foram forçadas a fechar plantas produtoras de fertilizantes.
Os preços à vista do potássio e da ureia nos Estados Unidos mais que dobraram em 2021 e os produtores “simplesmente não conseguirão arcar com estes preços”, de acordo com a consultoria internacional Green Markets. Os preços atualmente cobrados pela ureia no mercado norte-americano são os maiores desde 2012.
O custo do carvão no mercado global também pesou e continua a exercer um importante papel sobre os preços mais altos dos fertilizantes. A crise energética também exigiu que algumas indústrias paralisassem sua produção em plantas da China, por exemplo, o que agravou o quadro de oferta. São problemas em cadeia e os resultados aparecem em efeito dominó.
Todos esses problemas causarão um choque cada vez maior nos números da inflação global de alimentos. A alta nos custos de produção puxa para cima os preços dos alimentos de todas as naturezas – do açúcar ao trigo – e segue alimentando o movimento inflacionário. Para escapar dos altos custos, canavicultores buscam alternativas para racionar ou diminuir o uso de fertilizantes na safra 2022/23.
“Os agricultores poderiam repassar o custo mais alto dos fertilizantes para os consumidores na forma de menor produção agrícola e subsequente alta nos preços dos alimentos”, disse Alexis Maxwell, analista da Green Markets, consultoria de propriedade da Bloomberg. Impactos de todas as naturezas são esperados. Soja, milho, trigo, café, açúcar, arroz, feijão, frutas, demais grãos, todos estes são grupos de alimentos que já sinalizam preocupações graves.
Todavia, o consultor técnico na área de solos e sistema de produção, Leandro Zancanaro, acredita que os altos custos de fertilizantes poderão forçar agricultores do mundo todo a voltar aos conceitos básicos da agronomia, em especial no Brasil. A expectativa é que os produtores busquem garantir suas safras com bons níveis de produtividade e mitigação dos efeitos do choque na oferta de insumos agrícolas.
“O produtor terá que investir onde é preciso, resgatar conceitos básicos de agronomia, isso é tecnologia. Será um ano de mais tecnologia porque se usará mais conhecimento. Se usaremos mais ou menos insumos será consequência do conhecimento. Então, será um ano muito bom tecnicamente”, acredita Zancanaro.
O que diz a indústria
Em entrevista à Bloomberg, duas das maiores indústrias de fertilizantes do mundo – a Nutrien Ltd e a Mosaic Co., afirmaram que a alta nos preços tende a continuar, com destaque para o potássio e o grupo dos fosfatados. O representante da Mosaic afirmou ainda que alguns de seus clientes já estariam, inclusive, solicitando compromissos de produto até o segundo trimestre do ano que vem.
A Rússia começou a restringir suas exportações de fertilizantes depois de rumores de que a China poderia fazer o mesmo. Embora a medida na nação asiática ainda não tenha sido oficializada, a oferta de produtos chineses no mercado é nitidamente menor e o país vem adotando práticas de inspeção de seus produtos destinados à exportação que dificultam os processos.
A Frenlogi e o Instituto Brasil Logística têm acompanhado com atenção os desdobramentos da crise mundial no fornecimento de fertilizantes. Boa parte da balança comercial brasileira tem como fonte o agronegócio – que pode ser impactado fortemente com a falha no fornecimento dos insumos. Tanto a Frente quanto o IBL trabalham em parceria com o setor produtivo, com o setor de transportes e com o Governo Federal para encontrar soluções para a crise.
Fonte: Notícias Agrícolas